O índio brasileiro




“... índios de fala tupi, bons guerreiros, se instalaram dominadores, na imensidade da área, tanto a beira-mar, ao longo de toda a costa atlântica e pelo Amazonas acima, como subindo pelos rios principais, como o Paraguai, o Guaporé, o Tapajós, até suas nascentes.
...Não era, obviamente uma nação, porque eles não se sabiam tantos nem tão dominadores. Eram tão só, uma miríade de povos tribais, falando línguas do mesmo tronco, dialetos de uma mesma língua, cada um dos quais, ao crescer, se bipartia, fazendo dois povos que começavam a se diferenciar e logo se desconheciam e se hostilizavam.
Se a história, acaso, desse a esses povos Tupi uns séculos mais de liberdade e autonomia, é possível que alguns deles se sobrepusessem aos outros, criando chefaturas sobre territórios cada vez mais amplos e forçando os povos que neles viviam a servi-los, os uniformizando culturalmente e desencadeando, assim, um processo oposto ao de expansão por diferenciação.
Nada disto sucedeu. O que aconteceu, e mudou total e radicalmente seu destino, foi a introdução no seu mundo de um protagonista novo, o europeu”.
Darcy Ribeiro – O povo Brasileiro

Texto e fotos José Ricardo Pinto. Parte da edição impressa do PONTO DE VISTA  agosto de 2012

A luta é feita com armas ou canetas


No dia 9 de agosto se comemorou o Dia Internacional dos Povos Indígenas. E nós, os brancos, temos uma dívida muito grande com o povo indígena que dominavam o Brasil na época do descobrimento.
Entre as sociedades indígenas existe uma variedade de culturas, modo de vida, costumes, línguas, rituais. As terras em volta das aldeias são muito importantes, é deste entorno que eles pescam, caçam e tiram os seus sustentos.
Os nativos vivem de maneira social organizada. Cada grupo tem o seu cacique (chefe), médico (pajé) e já vivem em aldeias (cidades)  há milênios.
Quando Cabral chegou à costa brasileira, em 22 de abril de 1500, estimava-se que por aqui havia cinco milhões de índios. A maioria pertencente às etnias Tupi e Guarani. Havia outras que eram chamadas de Tapuias, que falavam outras línguas, no dialeto Tupi.
     O contato inicial por meio século foi amistoso pelo fato do branco estar em minoria e por necessitar da mão de obra do nativo para a extração e transporte do pau-brasil. Em troca recebiam não apenas os espelhos e colares, mas principalmente facas, facões, machados e enxadas, objetos importantes que os índios não conheciam.

Jaime Grande Sol  Kaingang        

    Esta relação durou até que o pau-brasil deixou de ser interessante para o português e o cultivo da cana de açúcar passou a ser mais importante. O homem branco veio em maior número com o objetivo de tomar posse da terra e o índio virou obstáculo e uma fonte de mão de obra escrava. A relação passou a ser de conflitos e de guerras.
    Enquanto os índios possuíam arcos, flechas e bordunas, os portugueses usavam armas de fogo o que provocou a fuga dos indígenas para o interior do país. Outro fator que ajudou o português, e usado como arma, foram as doenças epidêmicas pela falta de imunidade dos índios. As cartas do padre jesuíta José de Anchieta dão conta da morte de mais de 30 mil índios vítimas da varíola.
     Os padres católicos pertencentes à Companhia de Jesus, os jesuítas, se espalhavam pelo mundo para barrar o avanço do protestantismo. Chegaram ao Brasil em 1549 para catequizar os índios, ensinando a língua portuguesa, o catolicismo e o modo de vida do europeu.

Maetawa  Umutina 

      Estes pregavam a sua superioridade, valorizando cada vitória sobre os indígenas. Condenava a necessidade de terem que sustentar cada índio feito escravo e o modo de vida do nativo. Tidos como preguiçosos estes não estavam acostumados à vida do europeu que tinha que lutar pelo bem da posse, pela comida farta do dia a dia. Os índios estavam acostumados com uma sociedade diferente. A terra e a água, a fauna e a flora lhes davam tudo do que precisavam.
Lorineu Gabriel Terana


    O padre Antonio Vieira, maior nome da literatura barroca na língua portuguesa, juntamente com a ordem jesuíta, foi um dos maiores críticos da escravidão indígena no século XVII, chegando a ir a Portugal pedir ao rei D. João IV o direito à liberdade dos índios brasileiros, o que conseguiu com sucesso. Nesta época o padre Vieira narra que entre 1615 e 1652 foram mortos mais de 2 milhões de índios nas guerras, no cativeiro e por moléstias levadas pelo branco. Isto só no estado do Maranhão.
    Durante o desbravamento do oeste brasileiro, os índios foram escravizados pelos bandeirantes para a conquista de novas terras e pelas buscas de minérios, principalmente o ouro e a prata. Mais uma vez o índio resistiu à escravidão, mesmo tendo alguns que se uniram aos bandeirantes. Muitos brancos se casaram com mulheres indígenas criando um laço de parentesco com alguns grupos surgindo o caboclo.

 Zahy Tenetehara Guajajara Ativista, atriz, modelo fotográfico

    Na constituição de 1824, os índios passam a ter os mesmos direitos e deveres dos brancos. Uma forma de anular seus direitos tradicionais, sobretudo os direitos as terras por eles ocupadas. Assim foi permitido o avanço sobre as terras indígenas e estes tinham que pedir o registro de posse das terras por eles ocupadas.
    O marechal Rondon, descendente de índios Terena, Borôro e Guana, chefiou a implantação de linhas telegráficas pelo Brasil, em especial pelo Mato Grosso. Neste período entrou em contato com inúmeras sociedades indígenas sempre de forma pacífica. Rondon tinha o lema “matar nunca, morrer se for necessário”
 Haoni  Kaiapó 

    No início do Estado Novo (1937-1945), o governo de Getúlio Vargas promove a marcha para o oeste, uma campanha de integração nacional. Em 1943, é organizada a Expedição Roncador-Xingu, fazendo parte dela os irmãos Villas-Bôas (Orlando, Cláudio e Leonardo).
    Já na reserva no exército, Rondon foi nomeado presidente do Conselho Nacional de Proteção aos Índios (CNPI). E em 1952 apresenta ao Presidente da República, Getúlio Vargas, o projeto de lei que criaria o Parque Indígena do Xingu. Em 1961o presidente Jânio Quadros criou o Parque Nacional do Xingu. A primeira terra indígena homologada pelo governo federal a mais importante reserva indígena das Américas.

Taquari Tupinamba 

    O Parque Nacional do Xingu visa a preservar a fauna e a flora ainda intocadas da região e também resguardar as culturas indígenas da área. Os irmãos Villas-Bôas contribuíram com as idéias de Rondon na política de preservação da cultura indígena, interferindo o mínimo possível na vida e organização social destes povos.
    Neste contato com os índios do Xingu, os irmãos Villas-Bôas aprenderam toda gama da cultura indígena e defenderam, além da integridade física, também a integridade cultural, deixando de lado as antigas teorias pacifistas para transformar os índios em mão de obra rural.

Karajá-PA  Karen

    Atualmente os índios sofrem, em nome do progresso, os mesmos descasos da época do descobrimento e da colonização. Em busca das matérias primas que beneficiará as corporações nacionais e multinacionais, suas terras são invadidas, ou desrespeitadas em nome do progresso e do capital financeiro.
    Líderes e parte da população indígena são mortos, apoiados no descaso do poder executivo e judiciário brasileiro. Em nome do desenvolvimento econômico do país povos indígenas estão tendo que sair de suas terras sem ao menos serem ouvidos. São aproximadamente 450 projetos que afetam terras indígenas patrocinados pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Ubiranã Pataxó, filho do Pajé de Coroa  Vermelha

    O maior exemplo disto são os valores usados pelo governo federal para a construção da Usina de Belo Monte, 30 bilhões de reais, contra 17 milhões de reais para as demarcações das terras indígenas.
    Dos 1.046 territórios indígenas, apenas 363 estão regularizados. Em alguma fase de regularização tem 335 e outros 348 são reivindicados por povos indígenas no Brasil.

Ianã  Wassu Cocal 

    Hoje a população indígena no Brasil é de 896,9 mil índios, de 305 etnias que falam 274 idiomas.
    Muitos criticam os índios por, alguns, usarem do método do branco para venderem madeiras e parte de suas terras. Estes se deixaram influenciar pelo modo de vida do homem “civilizado”. 

 Bororo Kuga Curineu Bororo- MT  

    Outros os criticam pelo modo sossegado de viver, mas se esquecem que os índios não precisam de muito para sobreviver quando estão em suas áreas protegidas. Delas tiram seus sustentos. A pesca, a caça, o fruto. Mas quando se veem na necessidade de lutar por seus direitos se transformam em guerreiros, seja com a lança ou, na atualidade, com a caneta.









Comentários

FATIMA disse…
Parabéns!!!
Belo trabalho.

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